(FOLHAPRESS) – O tarifaço promovido pelo governo dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros pode afetar diversas empresas listadas na Bolsa de Valores. Porém, enquanto gigantes como Marfrig conseguem driblar a sobretaxa de 50%, empresas menores, chamadas de small caps, como Jalles Machado, Recrusul e Taurus, são mais impactadas. Levantamento da Elos Ayta Consultoria mostra que, das 20 maiores quedas de ações listadas na B3 e pertencentes a algum índice (Ibovespa, Small Cap ou Dividendos) desde 9 de julho, quando o presidente Donald Trump anunciou a sobretaxa de 50%, 17 fazem parte do índice Small Cap. Small caps são companhias listadas em Bolsa, mas com baixa capitalização. Elas são bem menores que as blue chips, como Petrobras e Vale -a Jalles Machado, por exemplo, tem R$ 965 milhões de valor de mercado, enquanto a capitalização da Marfrig é de R$ 18,6 bilhões. O valor de mercado reflete a maior capilaridade da Marfrig, que também acessa os EUA por meio de suas subsidiárias no Uruguai e na Argentina. Além disso, está presente em próprio solo norte-americano com a National Beef. Ao todo, o volume vendido aos Estados Unidos em 2025 foi de 27 mil toneladas. Apenas 7.000 são brasileiras, o que representa 0,18% do total de vendas da empresa. “Nossas operações no Brasil continuam normalmente, sem interrupções nas linhas de produção e em plena capacidade, sem impactos na receita e na rentabilidade”, afirmou a empresa. Com um impacto tão inexpressivo na companhia, suas ações tiveram uma leve queda de 1,4% desde o anúncio do tarifaço, em linha com a desvalorização do Ibovespa, de 1,14%. Outro ponto que favorece os papéis da Marfrig no momento é a fusão com a BRF. Segundo analistas, a operação é mais benéfica para o frigorífico do que para a dona da Sadia e Perdigão, que tem sofrido na Bolsa. Já a Minerva consegue acessar o mercado norte-americano por meio de suas operações na Argentina, no Paraguai, no Uruguai e na Austrália. Ao todo, os EUA representam cerca de 16% da receita do frigorífico. As carnes do Brasil, especificamente, são 30% dessa exposição. Ou seja, a sobretaxa recairia sobre 5% da receita líquida. Com um impacto maior, as ações do frigorífico tiveram uma queda proporcional, de 8%. Essa estratégia de levar a exportação para outro país antes dos EUA, de modo a evitar a sobretaxa, se chama triangulação e será um bote salva-vidas para muitas empresas. No caso da empresa de açúcar e etanol Jalles Machado, cuja produção se concentra em Goiás e Minas Gerais, o impacto é maior, o que levou as ações a ceder 15,5%. Além do salto no imposto, joga contra as empresas do setor o baixo nível dos preços internacionais de açúcar, nas mínimas dos últimos quatro anos. O cenário pesa também sobre a Raízen e sua subsidiária Cosan, umas das exceções dentre as blue chips. Seus papéis despencaram 23% e 13,6%, respectivamente. As tarifas e a queda nos preços de açúcar vêm em um momento de alto endividamento da companhia, que atingiu seu pior patamar desde a entrada na Bolsa, em 2021, conforme levantamento da Elos Ayta, que mostrou que seria preciso que a empresa fosse três vezes maior, em patrimônio, para o pagamento de sua dívida. No quarto trimestre de 2024, a dívida líquida da Raízen foi de R$ 54,8 bilhões. Outro setor afetado pela taxação de Trump é o de veículos pesados, impactando as ações de Recrusul, Randon, Frasle, Tupy e JSL. Esta última, apesar de ser uma empresa de logística, também faz a revenda de caminhões no ramo de seminovos, que pode sofrer com uma maior oferta no mercado interno. Já a Tupy tem 20% de receita exposta aos EUA, aponta Aline Cardoso, diretora de Research do Santander. Porém, com unidades no México, a companhia pode transferir a produção e evitar a sobretaxa. “Além disso, esses contratos têm um repasse automático. E ela é a única fornecedora de bloco de motores para os seus clientes, o que lhe dá bastante poder de precificação”, diz Aline. Também dentro da taxação, mas fora de um índice da B3, a Taurus teve uma das desvalorizações mais expressivas. As ações da fabricante brasileira de armas e munições despencaram 31,75% desde 9 de julho. Para mitigar os efeitos da política de Trump, a fabricante pretende reforçar sua operação na unidade dos EUA, que representa 82,5% do seu faturamento. Já na outra ponta da Bolsa, não é possível destacar vencedores do tarifaço, dizem especialistas. “Grande parte dos retornos observados na lista [de maiores altas e baixas na Bolsa] revela que o impacto direto das tarifas foi limitado. As variações de desempenho das ações estão, em sua maioria, ligadas a outros fatores específicos de cada empresa”, afirma João Daronco, analista da Suno Research. Daronco cita a alta de 11,7% da Fleury como exemplo, já que o papel foi impulsionado pela possível oferta de aquisição por parte da Rede D’Or. Ainda pesa sobre os papéis a temporada de balanços referentes ao segundo trimestre. No caso da CBA (Companhia Brasileira de Alumínio), a queda de 27% aconteceu quase que inteiramente após o resultado da companhia vir abaixo das expectativas. “Para a CBA, os EUA representaram 4% da receita da empresa em 2024. Então, ela consegue redirecionar [a produção] facilmente, e o impacto da sobretaxa é desprezível”, diz Aline, do Santander. O efeito das taxas adicionais também é irrelevante para a economia brasileira. A XP estima que o PIB (Produto Interno Bruto) terá uma queda de 0,02% com a medida. Dessa forma, a corretora não vê a necessidade de ajustes relevantes nas carteiras dos clientes. “Não entendemos que haverá impactos macroeconômicos relevantes para o Brasil, e as reações dos mercados locais têm sido moderadas em relação à guerra tarifária dos EUA com o Brasil e demais países”, diz Rodrigo Sgavioli, diretor de alocação da XP. Carlos Castro, planejador financeiro pela Planejar, também alerta que os investidores devem evitar as reações precipitadas de curto prazo. “É válido fazer uma revisão pontual se a carteira de investimento tiver fundos ativos que são impactados pelo efeito do tarifaço. Mas, em linhas gerais, as pessoas precisam levar em consideração seus objetivos de médio e longo prazo e não sair mexendo nos investimentos em razão das volatilidades de curto prazo”, diz Castro. O risco é um eventual impacto indireto, como a alta do dólar, pressionando a inflação. Para se proteger do efeito cambial, os especialistas também recomendam expor uma parte da carteira a ativos internacionais, como ações e moedas estrangeiras, de modo a blindar o patrimônio de uma desvalorização do real. Uma das pressões sobre a moeda brasileira é a saída de investimento estrangeiro do país, com a aversão a risco global. Em julho, houve uma retirada líquida de R$ 6,27 bilhões de estrangeiros da B3, o pior resultado desde abril de 2024. Segundo Aline, do Santander, esse movimento foi uma realização de lucros diante de um cenário mais incerto. “Eu conversei bastante com estrangeiros ao longo do mês, e o feedback que eu recebi é que o Brasil tinha subido muito no ano, especialmente em dólar, porque o Ibovespa havia avançado 15% e o real tinha valorizado mais uns 10%. Então, o Brasil era uma das Bolsas que mais subiam no mundo.” Outro risco no radar é um possível aumento de tensão entre os governos de Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o que também pode prejudicar a moeda brasileira e, consequentemente, os preços. O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) tem desacelerado, mas segue acima do teto da meta, de 4,5%, acumulando alta de 5,35% nos últimos 12 meses. Quanto mais o índice demora a ceder, mais a Selic permanece em um patamar elevado. A expectativa é que a taxa fique em 15% até o fim deste ano e caia para 12,50% em 2026. Juros altos são prejudiciais à Bolsa de Valores, pois aumentam o custo das empresas, reduzem o consumo e estimulam o fluxo para a renda fixa. Também pesa contra o mercado acionário a proximidade das eleições presidenciais de 2026. Com a incerteza de quem sairá vencedor, muitos investidores preferem esperar para tomar decisões de investimento. Aline, do Santander, vê a baixa de algumas ações como oportunidade de investimento. “Especialmente setores domésticos que tem zero impacto das tarifas, como varejo, saúde, construção civil, infraestrutura, de serviços básicos.” O que são os minerais de terras raras e seus usos Por que os países estão disputando esses recursos naturais Notícias Ao Minuto Brasil | 13:48 – 10/08/2025
Gigantes da Bolsa conseguem amortecer impacto do tarifaço, mas empresas menores sangram
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