Previsão de recorde na safra de grãos pode ajudar a baixar o preço dos alimentos?

Previsão de recorde na safra de grãos pode ajudar a baixar o preço dos alimentos?

“Estou muito confiante de que a safra desse ano, por todos os relatos que eu tenho tido do pessoal do agro, vai ser uma safra muito forte. Isso também vai ajudar”, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na última terça-feira (4). A colheita de grãos deverá ser 8,2% maior entre 2025 e 2026 do que no período anterior, projeta a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Isso seria um novo recorde e inclui alimentos como feijão, arroz, milho e soja, usada na ração de animais. Mas como uma safra maior pode influenciar no preço da comida? ➡️ Pesquisadores ouvidos pelo g1 entendem que ela pode ter algum impacto, mas isso não será sentido de imediato. E alertam que outros fatores também pesam no preço dos alimentos. “(Uma safra maior) É uma boa notícia, porque pode arrefecer um pouquinho o preço. Pode deixar um pouco mais barato o custo da produção de carne, dando um exemplo. A gente também tem o óleo de soja e outros produtos que derivam ali dos grãos que, mantendo tudo como está, podem ajudar”, diz Aniela Carrara, do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea). A pesquisadora alerta que o preço dos grãos é muito dependente do mercado externo e, portanto, do valor do dólar frente ao real. A alta da moeda americana aumentou os custos de produção e elevou a exportação, diminuindo o volume de alimentos disponível no país. Isso porque, com o real desvalorizado, o mercado externo vai continuar mais atrativo para os produtores do que o interno. Na última terça, além da previsão da safra, Haddad citou uma recente trajetória de queda do dólar como parte da expectativa do governo de que o preço dos alimentos diminua nos próximos meses. Mas outros fatores também impactam no prato feito. Um deles é o clima: o encarecimento dos alimentos em 2024 foi provocado pela seca histórica. Para este ano, a previsão é de um cenário menos catastrófico, o que contribuiu para a projeção da safra maior. Também pesam o aumento da renda do brasileiro, que, por sua vez, eleva o consumo, e o ciclo produtivo de cada alimento. Saiba mais abaixo. O impacto de uma safra maior Diferente do calendário tradicional, o ano agrícola segue o ciclo produtivo das principais culturas, como a soja, e, no Brasil, tem início em julho. Deste modo, a safra em vigor (2024/25) já está com a colheita em andamento, o que significa que, dificilmente, a previsão de recorde não vai se concretizar, explica Sergio Vale, economista e professor do Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio (IBDA). Mas isso não é novidade: a safra de grãos vem batendo recordes seguidos no Brasil nos últimos anos. Em 2023/24, por exemplo, o crescimento foi de 19,6% na comparação ao ciclo anterior, segundo o índice de Produção Agrícola Municipal (PAM), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esses números são explicados pelo ganho de produtividade, explica Carrara, do Cepea. Mas a boa safra em 2025/26 deve demorar para se refletir em suas gôndolas. Para Sergio Vale, do IBDA, o impacto começaria a ser sentido pelo consumidor apenas no segundo semestre. “[A inflação vai acontecer], mas talvez ela seja menor do que a gente previa”, afirma André Braz, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV – Ibre). Para 2025/26, a Conab projeta alta para soja, milho, arroz e feijão, que terá, segundo a companhia, a segunda maior safra dos últimos 15 anos, perdendo apenas para a temporada 2013/14. O plantio do café funciona em um sistema de bienalidade, ou seja, em um ano há uma produção maior e, no outro, menor. Mas, nos últimos 4 anos, essa regra foi quebrada e as safras são sempre menores, devido aos problemas climáticos, ao passo em que o consumo cresce. Já os preços de alimentos considerados de ciclo curto, como o tomate, a batata e a cebola, não são influenciados pelo tamanho da safra de grãos. Para eles o clima, por exemplo, tem mais peso. Clima deve ‘castigar’ menos neste ano A previsão de uma safra boa de grãos é motivada pelo cenário climático, que já é melhor do que o do ano passado. “No último ano, tivemos uma seca totalmente generalizada. Essa situação que a gente teve certamente não se repetirá em 2025. Em 2024, foi completamente fora do normal”, afirma Ana Paula Cunha, especialista no monitoramento de secas no Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden). Já em janeiro deste ano, teve início o La Niña, que ocorre quando há o resfriamento da faixa Equatorial Central e Centro-Leste do Oceano Pacífico. Ele é estabelecido quando há uma diminuição igual ou maior a 0,5°C nas águas do oceano. Seus efeitos tendem a se tornar cada vez mais fracos com o passar dos meses, explica Cunha. “Vai ficar dentro de uma condição fraca para neutra. Só que precisamos ficar atentos ao Oceano Atlântico Tropical Norte, que é onde se configura toda a nossa chuva, principalmente no Nordeste e no Norte do país”, explica. A especialista prevê que o cenário deste ano será parecido com o de 2021, quando as chuvas foram mais irregulares pelo país. De acordo com a pesquisadora, o último ano em que se ocorreu uma situação climática considerada próxima ao “normal” foi em 2018. Calor deixa o café ‘estressado’, pode derrubar a produção brasileira e encarecer a bebida O que mais pode reduzir o preço? Para os especialistas entrevistados pelo g1, outros fatores precisam acontecer em conjunto com a boa safra dos grãos para que os alimentos fiquem mais baratos. Confira abaixo. ➡️Elevação da taxa de juros: esse índice impacta diretamente no câmbio, ou seja, pode tornar o dólar mais barato, aponta Carrara, do Cepea. Contudo, a especialista explica que, normalmente, este tipo de mudança leva em torno de 6 meses para interferir no preço dos alimentos. ➡️Taxas de juros menores para os agricultores: uma taxa de crédito especial no Plano Safra para os produtores que atuam diretamente com a alimentação seria importante para baixar os preços, uma vez que estimula a produtividade no campo e aumenta a oferta, explica o especialista. De acordo com o ministro na ocasião, a taxa diferenciada por cultivo já existe no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), administrado pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário. ➡️Transporte melhorado: grande parte do custo dos produtos acontece por causa da logística. Atualmente, o sistema é quase totalmente rodoviário, o que faz com que os valores de diesel e gasolina tenham grande impacto no preço dos alimentos, explica Braz. O economista acredita que o Brasil poderia usar melhor o transporte fluvial, por exemplo. ➡️Construção de silos: essas estruturas são essenciais para guardar os grãos excedentes. Sem eles, parte da colheita pode ser desperdiçada. Além disso, com o sistema adequado, os pequenos produtores, que não conseguem ter seu próprio armazenamento, ficariam mais estimulados a plantar, diz o pesquisador da FGV. ➡️Mais tecnologia: considerando as mudanças climáticas, que tornam cada vez mais imprevisível qual é a melhor época de plantio e se haverá uma boa safra, Braz acredita ser importante investir em sementes resistentes a seca e altas temperaturas, para minimizar as perdas. Prato do Futuro: pesquisa cria milho mais resistente ao calor Por que os alimentos encareceram? Diversos fatores vêm afetando o preço dos alimentos, segundo os especialistas entrevistados pelo g1. Veja a seguir. ➡️Fenômenos climáticos: com o El Niño, a seca no país foi generalizada em 2024, o que prejudicou a colheita de várias culturas importantes, como a laranja e o café. O clima também provocou a baixa qualidade da pastagem, o que impacta no preço da carne. ➡️Desvalorização cambial: a alta das moedas estrangeiras torna as commodities mais caras, uma vez que são negociadas no mercado internacional. Ela também torna mais atraente ao agricultor comercializar os seus produtos fora do país, o que derruba a oferta dos produtos para o consumidor nacional. Além disso, o dólar mais caro torna o custo de produção mais elevado, já que insumos, como fertilizantes e agrotóxicos, são importados. ➡️Alta do consumo: a demanda pelos alimentos no mercado interno também aumentou. Isso porque, em 2024, o Brasil teve uma queda do desemprego. No ano passado, o país registrou a menor taxa média desde que o IBGE começou a calcular esse índice, em 2012, ficando em 6,6%. “A sensação que as famílias têm é de que o seu poder de compra está diminuindo e é verdade. Porque se as famílias de baixa renda comprometem a maior parte de seu salário com a compra de alimentos e essa compra de alimentos está cada vez mais cara, significa que essa sacola de compras está ficando cada vez mais leve”, afirma Braz. Cafezinho em risco: como sombra de árvores pode ser solução para aumento da temperatura

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