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Papa Francisco modernizou postura da Igreja sobre fiéis gays

por gabriellalodi
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Quando Jorge Mario Bergoglio era cardeal e também arcebispo de Buenos Aires se opôs ao reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Em julho de 2010, pouco antes da Lei do Matrimônio Igualitário ser aprovada na Argentina, ele escreveu uma carta para as freiras carmelitas da capital sobre o assunto.No texto, Bergoglio alegou que este projeto legislativo sobre casamento entre homossexuais é uma “movida” (movimento) de Satanás.“Não é uma simples luta política, e sim uma tentativa de destruir o plano de Deus, um movimento do Pai da Mentira que busca confundir e enganar os filhos de Deus” escreveu o cardeal.Desde que foi eleito papa, em 13 de março de 2013, Francisco adotou um tom acolhedor em relação às pessoas da comunidade LGBTQIA+ e mudou de maneira drástica a linguagem da Igreja Católica em relação aos homossexuais.Logo no início de seu pontificado, em julho de 2013, o papa chamou atenção ao afirmar: “Se uma pessoa é gay e procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgar?”, afirmou Francisco a jornalistas em um voo após uma viagem que fez ao Brasil.De acordo com a Igreja Católica, a atração por uma pessoa do mesmo sexo não é pecaminosa, mas os atos homossexuais são.Assim, a declaração de Francisco marcou uma mudança de postura da Santa Sé, algo que foi visto como negativo pela ala dos conservadores do Vaticano.Relembre os posicionamentos do papa Francisco sobre o tema ao longo dos anosPara entender exatamente a evolução da postura do papa Francisco em relação ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e do relacionamento da Igreja Católica com os fiéis da comunidade LGBTQIA+, é preciso relembrar como o pontífice tratou o tema ao longo do pontificado.Em outubro de 2013, em uma das primeiras providências do seu papado, Francisco convocou Sínodo dos Bispos sobre a Família. Para preparar o encontro, o papa enviou aos bispos do mundo inteiro um longo questionário, no qual constavam quatro perguntas sobre a união de pessoas do mesmo sexo.Pela primeira vez a Igreja Católica consultou todas as suas paróquias espalhadas pelo mundo sobre a questão dos homossexuais na família.Em janeiro de 2015, Francisco recebeu no Vaticano um transexual espanhol com a sua namorada. O homem disse que se sentia marginalizado pela Igreja após a transição de gênero.Em abril de 2015, na tradicional cerimônia do Lava-pés na Quinta-Feira Santa, em uma prisão romana, Francisco lavou os pés de 12 detentos, que incluíam homens, mulheres e uma transexual brasileira.Durante dois anos, mais de 300 bispos debateram sobre os desafios da família na Igreja.Em outubro de 2015 foi apresentado o relatório final do Sínodo sobre a Família.O documento afirma que os homossexuais não devem ser discriminados na sociedade, mas também declara que “não existe fundamento algum para equiparar ou estabelecer analogias, mesmo remotas, entre as uniões homossexuais e o plano de Deus sobre o matrimônio e a família.”Em agosto de 2018, na coletiva durante voo de volta de Dublin, onde havia terminado o Encontro Mundial das Famílias, um jornalista perguntou ao papa sobre o que ele diria a pais e mães com filhos homossexuais.“Primeiro, reze. Não condene, dialogue. Entenda, abra espaço para seu filho ou filha. Dando espaço para que se expresse. Jamais direi que o silêncio é um remédio. Ignorar um filho ou filha com tendências homossexuais seria um fracasso da maternidade e da paternidade. Você é meu filho ou minha filha do jeito que você é.” disse Francisco.Em maio de 2019, em entrevista à emissora mexicana Televisa, o papa reiterou: “Pessoas homossexuais têm o direito de estar na família. Pessoas com orientação homossexual têm o direito de estar na família, e os pais têm o direito de reconhecer aquele filho como homossexual, aquela filha como homossexual. Você não pode expulsar ninguém da família e tornar sua vida impossível.”Em outubro de 2020, no documentário “Francesco” do cineasta americano de origem russa Evgeny Afineevsky, o papa Francisco afirmou que os gays têm direito a uma família e que isso deve ser protegido por lei.“Os homossexuais têm o direito de estar em uma família. São filhos de Deus e têm direito a uma família. Não se pode expulsar ninguém de uma família ou atirar alguém na miséria por isso. O que temos que fazer é uma lei de convivência civil. Assim terão o direito de estar cobertos legalmente”, afirmou Francisco no filme.A declaração foi interpretada por muitos como uma defesa do papa Francisco à união civil de casais gays.Em 2 de novembro de 2020, poucos dias depois, o Vaticano veio a público, por meio de uma nota, esclarecer que a fala do pontífice foi tirada do contexto e que não representava uma mudança na posição da Igreja Católica em relação ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e aos homossexuais.Ainda segundo o Vaticano, a declaração foi construída a partir de duas respostas que o papa deu a duas perguntas diferentes quando Francisco falava sobre o caso de um homem gay que tinha três filhos adotivos que tinha medo de ir à Igreja com as crianças e o companheiro e ser hostilizado.A nota do Vaticano afirma ainda que na primeira parte da fala, Francisco não se referia à união civil gay e, sim, ao direito dos irmãos e filhos homossexuais de serem aceitos dentro de suas famílias.Por fim, o Vaticano ainda afirma que o diretor do filme cortou o trecho da resposta do papa na qual afirmava que era contra o casamento gay.Ao longo dos anos que liderou a Igreja, Francisco reafirmou diversas vezes que a Igreja não pode equiparar as uniões homoafetivas ao casamento religioso entre um homem e uma mulher.Bênção a casais gaysEm 15 de março de 2021, a então Congregação para a Doutrina da Fé, o principal escritório doutrinário do Vaticano, divulgou um documento aprovado pelo papa Francisco que afirma que padres não podem abençoar uniões homoafetivas.A declaração foi emitida como uma resposta às perguntas de pastores e fiéis enviadas ao Vaticano sobre a questão.Ao explicar a decisão em uma nota, a Santa Sé se referiu à homossexualidade como uma “escolha”. O comunicado disse ainda que a bênção enviaria um sinal de que a Igreja Católica aprova e encoraja “uma escolha e um estilo de vida que não podem ser reconhecidos como objetivamente ordenado aos planos revelados de Deus”.“A bênção das uniões homossexuais não pode ser considerada lícita”, explicava o comunicado. “Deus não abençoa e não pode abençoar o pecado”, acrescentou a declaração.“Esta decisão não exclui as bênçãos dadas a pessoas individuais com inclinações homossexuais, que manifestam a vontade de viver em fidelidade aos planos revelados de Deus”, afirma o texto da declaração.Em 24 de março de 2021, Francisco nomeou o jornalista e ativista gay Juan Carlos Cruz como membro da Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores. O chileno foi vítima no passado de repetidos abusos sexuais por parte do ex-sacerdote chileno Fernando Karadima.Declaradamente homossexual, Cruz passou a integrar esta instituição ligada à Cúria Romana, criada pelo pontífice em 2014 para lidar com os escândalos pedofilia na Igreja Católica.Antes de ser nomeado membro desta instituição, em 2018, após um encontro com Francisco, o chileno disse ao jornal espanhol El País:“Ele [o papa] me disse: ‘Juan Carlos, não importa se você é gay. Deus te fez assim, te ama assim, e a mim não importa. O papa quer você assim; você tem que ser feliz consigo mesmo.’”Em 26 janeiro de 2022, Francisco afirmou que pais e mães devem apoiar seus filhos, mesmo que não sejam heterossexuais.O comentário foi feito durante uma audiência semanal no Vaticano, enquanto o papa se referia às dificuldades que os pais podem enfrentar na criação de filhos.Essas questões incluem “pais que observam diferentes orientações sexuais em seus filhos e como lidar com isso, como acompanhar seus filhos e não se esconder atrás de uma atitude de condenação”, disse Francisco.Em 21 setembro de 2022, no final de outra audiência geral, Francisco encontrou um grupo de 110 pessoas da associação “Tenda di Gionata”, que reúne cristãos LGBT.O encontro, que já estava programado com o consentimento do papa, aconteceu um dia após cinco bispos católicos de língua holandesa da região de Flandres, na Bélgica, aprovarem um texto litúrgico para a bênção de casais do mesmo sexo.O Vaticano não foi informado previamente da iniciativa belga.Em outubro de 2023, em uma aparente mudança de tom no Vaticano, o papa Francisco sugeriu, pela primeira vez, que casais homoafetivos poderiam ser abençoados por padres católicos, em decisões analisadas “caso a caso”.“Quando você pede uma benção, você expressa um pedido de ajuda de Deus, uma oração para viver melhor, uma confiança em um pai que pode ajudá-lo a viver melhor”, escreveu Francisco em uma carta endereçada a duros críticos dentro do Vaticano.O texto foi escrito em resposta a cinco cardeais conservadores que o questionaram formalmente sobre o assunto antes de um encontro no Vaticano.Em 18 de dezembro de 2023, dois meses depois, o Vaticano anunciou uma decisão histórica aprovada pelo papa Francisco de que padres católicos romanos poderiam passar a dar bênçãos a casais do mesmo sexo, desde que não façam parte de rituais ou liturgias regulares da Igreja.Entretanto, o texto pontua que as bênçãos não devem de forma alguma ser confundidas com o sacramento do casamento heterossexual. Seriam, portanto, um sinal de que Deus acolhe a todos.A decisão gerou reações divergentes dentro da Igreja, sendo vista como um avanço por setores mais progressistas e criticada pelos conservadores.O documento gerou resistência particularmente na África, onde a diretriz foi rejeitada por bispos. Em alguns países africanos, como a Uganda, a atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo pode levar à prisão ou até mesmo à pena de morte.Em 26 de janeiro de 2024, o papa Francisco enfatizou que as bênçãos são para indivíduos, não aprovação de uniões homoafetivas.Francisco afirmou em um discurso aos membros do Dicastério para a Doutrina da Fé, o departamento doutrinário do Vaticano, que o objetivo é “mostrar concretamente a proximidade do Senhor e da Igreja a todos aqueles que, encontrando-se em diferentes situações, pedem ajuda para continuar – às vezes começar – uma jornada de fé”.O papa acrescentou que “as bênçãos, fora de qualquer contexto e forma litúrgica, não requerem perfeição moral para serem recebidas.”Em maio de 2024, em entrevista à emissora americana CBS, Francisco voltou a enfatizar que Igreja está aberta a todos, mas uniões homossexuais não podem ser abençoadas.Criminalização da homossexualidadeAinda em janeiro de 2023, Francisco se referiu às relações homoafetivas como um pecado, mas discordou de que fossem consideradas como crime.“Não é crime, mas é pecado”, disse o papa durante uma entrevista à agência de notícias Associated Press. “Tudo bem, mas, primeiro, vamos distinguir entre um pecado e um crime”.O papa acrescentou que “também é pecado não ter caridade uns com os outros”.O pontífice chamou de “injustas” as leis que criminalizam a homossexualidade, dizendo que Deus ama todos os seus filhos como eles são e que os bispos precisam receber a comunidade LGBTQIA+ em suas igrejas.O papa também disse que a Igreja Católica pode e deve trabalhar para que essas leis sejam abolidas. E citou o catecismo ao dizer que os gays devem ser bem-vindos e respeitados, e não marginalizados ou discriminados.Em 27 de janeiro de 2023, o papa respondeu a uma carta do padre jesuíta americano James Martin, membro da pastoral de pessoas LGBTQ+. O sacerdote, que foi recebido alguns meses antes pelo pontífice no Vaticano, pedia explicações se ser homossexual é pecado.Francisco reafirmou ao padre que a homossexualidade “não é crime”. “Quando eu disse que é pecado, estava simplesmente me referindo ao ensinamento moral católico que diz que todo ato sexual fora do casamento é pecado”, escreveu o pontífice.Em 5 de fevereiro de 2023, no voo de volta da África, Francisco enfatizou que leis que criminalizam pessoas LGBT são um “pecado” e uma injustiça porque Deus ama e acompanha as pessoas com atração pelo mesmo sexo.Polêmica envolvendo expressão homofóbicaEm maio de 2024, o papa Francisco se envolveu em uma polêmica com a comunidade LGBTQIA+ quando o portal Dagospia, especializado em fofocas e bastidores, publicou que o pontífice usou uma expressão homofóbica em uma reunião a portas fechadas com bispos no Vaticano.Segundo o portal, o papa usou a palavra “frociaggine” – algo que, em uma tradução livre, equivale à expressão “viadagem” em português. Trata-se de um termo pejorativo para descrever pessoas LGBTQIA+.A notícia foi apurada pelos jornais Corriere della Sera e La Repubblica que, citando fontes, confirmaram a informação que o papa realmente usou a palavra “viadagem”.Aconteceu no dia 20 de maio, no encontro entre Francisco e os bispos italianos que chegaram a Roma para a assembleia geral.“Estávamos falando de uma questão muito séria. Em que medida os candidatos homossexuais ao sacerdócio devem ser admitidos nos seminários. E Francisco, ao mesmo tempo em que reiterava a necessidade de acolher a todos, em certo momento tentou dizê-lo à sua maneira, em tom coloquial: “Já existe muita ‘viadagem’ nos seminários” disse a fonte ao Corriere della Sera.Alguns dias após a publicação das reportagens, o Vaticano divulgou um comunicado dizendo que Francisco não teve intenção de usar “linguagem homofóbica” e pedia desculpas àqueles que se sentiram ofendidos.Após o relato inicial sobre o uso da palavra, o Corriere della Sera citou bispos que estavam na reunião e disseram que o papa, que é argentino, poderia não ter percebido que o termo italiano que usou era ofensivo.Poucos dias depois, em 11 de junho de 2024, Francisco voltou a usar o termo “viadagem”. O episódio ocorreu no encontro a portas fechadas na Universidade Salesiana com cerca de 200 sacerdotes da Diocese de Roma.O papa reiterou sua recusa em acolher jovens homossexuais que desejam se tornar padres. Segundo fontes presentes no encontro, citadas pela imprensa italiana, o pontífice disse: “Gays são bons sujeitos, seguem bons caminhos de fé, buscam o Senhor. Mas é melhor encaminhá-los a algum bom pai espiritual, a algum psicólogo…”Em seguida, Francisco acrescentou: “Um padre até me disse que hoje ser homossexual é motivo de orgulho. Não, a ideologia gay é muito forte e não é boa, o lobby gay ideologiza o fenômeno” completando que “A ‘viadagem’ no Vaticano não é boa.”Postura sobre homossexuais no sacerdócioEm 2005, o papa Bento XVI aprovou um documento divulgado pelo Vaticano em que a Igreja proíbe que homens que são ativamente gays ou têm tendências homossexuais “profundas” possam se tornar sacerdotes.Em 2016, o papa Francisco manteve a diretriz.Em maio de 2018, o jornal italiano La Stampa afirmou que o papa Francisco teria instruído bispos italianos a examinarem cuidadosamente os candidatos ao sacerdócio e a rejeitarem qualquer pessoa que suspeitassem ser homossexual.“Fiquem de olho nas admissões aos seminários, mantenham os olhos abertos. Em caso de dúvida, é melhor não deixá-los entrar”, teria dito Francisco em uma reunião a portas fechadas, segundo o La Stampa. Na época, o Vaticano não confirmou nem negou as alegações.Em janeiro de 2025, o site da Conferência Episcopal Italiana (CEI), que é a assembleia dos bispos da Igreja Católica na Itália, publicou novas diretrizes que permitem que homens gays entrem nos seminários desde que se abstenham de sexo.As novas regras dizem que os diretores dos seminários devem considerar as preferências sexuais de um candidato a sacerdote, mas apenas como um aspecto de sua personalidade.O texto é acompanhado por uma nota do gabinete do Vaticano, confirmando que as diretivas são válidas por um período experimental de três anos.

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